Certa
feita ouvi falar sobre uma teoria do senso comum, de que sobre cada
pessoa predomina um dos sete pecados capitais. Cada um teria um
pecado principal influenciando a vida e as decisões. Alguns seriam
atormentados pela gula, tendo dentro de si um apetite insaciável por
qualquer coisa que alimente seu desejo. Comida, bebida, poder,
dinheiro, sexo… Tudo que possa trazer uma sensação de “quanto
mais, melhor” vira um problema quando todas as ações se
restringem a ter mais e mais satisfação em consumir. Como um
viciado descontrolado diante do objeto de sua dependência, em casos
extremos levando a cometer atrocidades para ter cada vez mais, não
se importando com o mal que cause a si ou a outras pessoas. Outros
seriam regidos pela ira, deixando-se perder em ódio e sede de
vingança contra quem o provoque. Desejando mais do que tudo destruir
algo, ou alguém, e tomando todas as decisões com foco em conquistar
esse objetivo. Outros ainda seriam movidos principalmente pela
luxúria, colocando suas paixões e desejos materiais como prioridade
da vida, anulando em si tudo que não seja prazer físico e
ostentação de bens materiais. E assim por diante, tendo pessoas
controladas pela inveja, avareza, preguiça e orgulho. Cada um em seu
próprio mundo.
Em
princípio parece só mais uma bobagem de crendice popular mas,
meditando um pouco sobre esse tema, pode-se perceber de onde surgiu
essa superstição. Provavelmente a ideia de agrupar as más
tendências humanas em sete conceitos básicos e declará-las como
pecados foi o resultado de muita meditação e filosofia. Não vejo
porque discordar desses conceitos como sendo impulsos primordiais
reais inerentes aos seres humanos e também não discordo que são
prejudiciais, precisando ser contidos para não trazer sofrimento e
malefícios. Ao mesmo tempo, rapidamente posso pensar em personagens,
que conheci pessoalmente ou através de alguma ficção, que sejam
manifestações práticas de alguns desses ditos pecados em pessoa. É
comum conhecermos pessoas que vivem suas vidas segundo mandam seus
instintos mais fortes, em alguns casos sendo esses instintos algumas
dessas tendências nomeadas como pecados capitais. Ao longo do tempo,
conheci pessoas incrivelmente egoístas, cruéis, fúteis e
totalmente inconvenientes com seus desejos. Gente que atrapalha a
vida de outras pessoas sem dar a mínima importância para os efeitos
das suas ações, simplesmente levando em consideração o seu
próprio ponto de vista. Já tive o desprazer de conhecer gente tão
invejosa que a convivência obrigatória me desenvolveu doenças
psíquicas. Já tive que lidar com gente absolutamente descontrolada
sexualmente, que perturbava todos ao redor com sua nojenta
necessidade de sedução. Gente capaz de fingir amizade e respeito
por interesse, que eram educadas e gentis na frente mas quando virava
as costas se transformavam em poços de desprezo e arrogância. Gente
que se diverte com o sofrimento alheio, que solta gargalhadas diante
do desespero e sofrimento de outros. Por causa do meu trabalho, tive
que lidar com toda sorte de vermes que se pode imaginar, a política
atrai o que há de pior no mundo, mas também por passar muito tempo
com a mente alterada, escolhi mal minhas companhias e aceitei a
presença de gente falsa, com discursos artificiais de amizade e
carinho. Pessoas que invariavelmente se aproveitaram das minhas boas
intenções enquanto fingiam se importar comigo. Tanto na vida
profissional quanto na pessoal, tive que conviver com pessoas más
que me prejudicaram mais do que eu deveria ter deixado. Algumas
dessas relações duraram anos e me custaram muito em termos de saúde
mental. E nesses casos, vejo claramente o que queriam dizer as
pessoas que inventaram a teoria de sermos mais influenciados por um
ou outro pecado capital. Os piores sentimentos e comportamentos
humanos podem ser agrupados segundo uma lógica nos sete aspectos
elencados biblicamente. E é perfeitamente possível conhecer pessoas
que manifestam alguns desses ímpetos com mais intensidade, ao ponto
de serem criaturas de caráter maligno, prejudicial à quem está
sujeito à sua presença.
Mas
não é só nos outros que é possível perceber tendências que
possam ser descritas nos sete pecados capitais. Olhando para mim
mesmo e analisando diferentes épocas da vida, percebo que eu também
fui governado por algumas dessas tendências. Talvez não possa
sentenciar um único pecado para toda a vida, talvez no meu caso seja
um pecado para cada fase. Posso identificar períodos em que fui
governado pela ira, pela gula, luxúria, ou até mesmo fragmentar
ainda mais o tempo e identificar a energia dos pecados em decisões
isoladas. Em alguns casos sendo avarento, noutros sendo invejoso.
Sempre com consequências tristes com o passar do tempo. Ao mesmo
tempo em que minha memória rapidamente elege figuras desprezíveis
que me prejudicaram movidos por esses impulsos pecaminosos, também
trago no coração arrependimentos e mágoas por ter sido eu em
diversas ocasiões o autor da injustiça.
Hoje
em dia posso dizer que tento ser cuidadoso nas minhas ações, me
esforço para não ser cruel com quem quer que seja. Policio minhas
decisões e interpretações da vida e do mundo, sempre tentando
ficar longe do que julgo ser o mal, o que pode perfeitamente ser
enquadrado no que descrevem os sete pecados capitais. É um
compromisso que tenho comigo mesmo e com Deus, de andar na linha,
fazer o que é certo e nunca ser injusto ou me beneficiar do prejuízo
de alguém. Tento não ser invejoso, tento não ser raivoso, tento
não ceder aos desejos ao ponto de ser escravo, tento ser alguém
decente. Não é um caminho fácil, é preciso esforço para não
fazer o mal. Mas apesar de estar muito longe da perfeição, já noto
resultados positivos em mim mesmo no que diz respeito ao convívio
com as pessoas. Continuo sendo um reles humano, mas me esforço para
ser um humano dos bons. Atualmente o pecado que mais se destaca em
mim, sem dúvida, é a preguiça. Em parte por causa da depressão,
mas não só por isso, preciso travar batalhas diárias para fazer o
que devo sem desistir. E mesmo cheio de afazeres, sinto que poderia
produzir muito mais se não passasse tanto tempo me entregando ao
nada. Talvez nessa fase atual, o pecado capital mais influente em mim
seja esse, ou, pelo menos é o que mais se destaca. Perceber isso me
ajuda a entender onde devo agir para melhorar. Me faz saber qual o
nome do adversário que estou enfrentando e bolar estratégias para
derrotá-lo.
Refletir
sobre essa teoria me fez pensar em várias coisas que podem vir a ser
úteis no entendimento da vida. Me ajuda a ter certeza de que é
preciso ficar longe de gente má e, quando for impossível, pelo
menos evitar ao máximo que sua influência exerça algum controle.
Lembrei de um monte de gente com quem aprendi como não devo ser,
exemplos negativos de como é estar perto de alguém ruim. E também
percebi em mim mesmo coisas que carrego nas recordações que
gostaria de não ter feito, vezes em que gostaria de ter sido uma
pessoa diferente. Parâmetros e referências para me basear no que
quero ser hoje e no que devo me concentrar para melhorar.
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