A
ansiedade faz sofrer por antecedência. E não é pouco. Insônia,
queda de cabelo, gastrite, dores musculares, ânsia de vômito pela
manhã. Só de estar imerso em compromissos que tem sua parcela de
chance de darem errado, coisa comum na vida, já é o suficiente para
desencadear um tormento patológico totalmente desproporcional. O
ritmo de vida que levo, entre trabalho e estudos motivados pelo senso
de obrigação, normalmente já seria suficientemente pesado de
carregar pelas próprias características dos afazeres. Mas tudo fica
muito pior com a antecipação das emoções de falha e fracasso que
a doença me faz ter em tudo que faço.
Estamos
nas semanas finais do ano, com trabalhos grandes para entregar e
provas decisivas em todas as disciplinas da faculdade. Além dos
preparativos tradicionais no meu trabalho para encerrar e preparar o
início do próximo ano, com relatórios e programações que
transcendem em muito o horário de expediente. Uma rotina corporativa
tradicional com atividade universitária padrão. De forma alguma
pode-se classificar esses períodos como fáceis. São parte do
sacrifício diário que é viver e acreditar em dias melhores. Mas
faço tudo ser ainda pior com essa maldita doença que vê tudo como
ruim e espera sempre o pior cenário possível.
A
vida, às vezes, se enche de coisas que não temos lá muito prazer
em fazer mas que são necessárias para que tudo continue funcionando
como deve. E nessas horas é preciso soprar as brasas da motivação
e seguir fazendo o que é devido com o máximo de esmero possível,
buscando focar a mente no senso de dever com mais intensidade do que
nos sonhos. São etapas onde o que quero de verdade para minha vida
se torna um objetivo menos valorizado nos pensamentos diários. Não
chegam a sumir, mas ficam em segundo plano enquanto escrevo,
organizo, preparo apresentações e cumpro prazos.
Mas,
neste ano, pela primeira vez na vida, acho que estou vivendo com o
grau de lucidez necessário para manter a fé nos meus sonhos apesar
de todo o veneno que a ansiedade e a depressão fazem circular no meu
corpo e mente. Apesar de estar estressado, chateado por ter que
ocupar um espaço tão grande no meu tempo com tarefas insossas. E
por ser metralhado todos os dias com uma bateria de artilharia pesada
de pensamentos desagradáveis de desânimo, frustração antecipada
por coisas que podem não sair como o esperado, baixa auto estima,
descrença… Isso tudo com sintomas físicos de cansaço e
somatização de coisas ruins. Apesar disso tudo, eu finalmente sei o
que responder quando me pergunto o que quero dessa vida. E a resposta
é clara, direta. Não algo abstrato, hipotético. Mas, sim, um sonho
concreto e possível de alcançar. Isso faz toda a diferença.
Lembro
de uma cena do filme Clube da Luta (dirigido por David Fincher,
1999), onde o personagem Tyler Durden, interpretado por Brad Pitt,
está dirigindo um carro na chuva e pergunta “o que vocês
gostariam de fazer antes de morrer?” e, prontamente, os space
monkeys que estão com ele respondem: “Pintar um auto retrato” e
“construir uma casa”. Na história, Tyler arquiteta com um amigo
uma organização terrorista anarquista que não visa tomar o poder,
mas simplesmente questioná-lo deliberadamente. Oferecendo uma visão
libertária para seus adeptos. Fazendo-os pensar sobre sua existência
e seu papel no mundo. No mesmo filme ele ainda aponta uma arma para a
cabeça do desesperado Raymond e que em lágrimas revela que gostaria
de ser veterinário, mas acabou como balconista numa loja de
conveniência. O que irrita Tyler que o ameaça de morte se não
perseguir seus sonhos a partir do dia seguinte. Nos dois casos vemos
que ter um sonho para si mesmo é algo importante para Tyler e seus
discípulos. Tão importante quanto a percepção de que a vida um
dia chegará ao fim. De forma violenta, o filme nos diz que ter
consciência clara sobre o sonho da vida é fundamental, assim como
perseguir esse sonho. O sonho é o que nos leva a dar o passo adiante
em nossa vida sem sentido que um dia terminará independentemente da
nossa vontade. Essas cenas, e esse filme como um todo, passaram a
fazer muito mais sentido para mim quando me dei conta que um dia
minha vida acabará sem que eu possa fazer nada para interferir. Nem
mesmo as tentativas de suicídio foram capazes de antecipar a hora da
minha partida. A minha hora de morrer é um total mistério, apesar
de ser a mais certeira das ocasiões da vida. A única certeza que
podemos ter é que um dia morreremos, mas geralmente não se pensa
muito nisso. E pensar nisso faz mudar alguns conceitos. Juntamente
com essa consciência de mim mesmo e da consequente finitude da vida,
as experiências me trouxeram a ter hoje uma clareza em algo que
quero mais do que tudo. Um desejo que gostaria de realizar antes de
morrer, o maior sonho da minha vida. Tal qual os space monkeys do
filme ou o pobre Raymond ajoelhado no chão com um revólver apontado
para sua cabeça, eu mesmo hoje tenho autoconhecimento suficiente
para saber o que quero da vida. Posso responder instantaneamente sem
titubear se me for perguntado. E isso é que tem feito toda a
diferença na minha jornada.
Sigo
fazendo o que devo. Acordando de manhã, cumprindo as tarefas no
trabalho e na faculdade, lidando com a depressão e a ansiedade
enquanto me espremo para fazer tudo que tenho que fazer. Passo pela
vida suportando a ideia de usar meu tempo com obrigações
inevitáveis e brigando com as doenças que me atormentam a mente.
Mas, neste momento, depois de tudo que passei e tudo que descobri
sobre mim mesmo, faço isso sabendo qual é meu sonho, e agindo em
favor dele. Fazendo algo ao meu alcance para me aproximar de realizar
esse sonho. Por menor que seja a iniciativa, por mais simples e
singela que seja a ação, qualquer coisa que faça em direção a
realização desse sonho me renova as forças. Fortalece a esperança
e clareia a mente. Tudo que estou passando é passageiro, pois tenho
um plano particular em andamento, algo muito íntimo, que é o meu
real propósito na vida. E tenho feito o que está a meu alcance para
realizá-lo. Não importa o quanto minhas rotinas sejam chatas e sem
sentido, as tarefas do dia a dia que sou obrigado a cumprir não são
minha prioridade. Existe um sonho, um objetivo maior que norteia
minhas decisões mais importantes. Por isso nada de desagradável
importa realmente, pois tudo passou a ser parte do plano. Tudo está
me levando em direção ao meu sonho.
Se
sua vida não é o que você gostaria que fosse, sugiro que faça
esse exercício, de buscar dentro de si a resposta para a pergunta
“qual o meu maior sonho?”. E no mesmo instante que descobrir a
resposta, passar a fazer algo para conseguir isso. Algo que pode ser
uma ação pequena no meio da semana, alguns minutos do dia. Passar a
fazer algo que esteja ao seu alcance e que possa ser feito com
frequência, para que possa sentir que, mesmo que pouco, está
fazendo algo para realizar o seu maior sonho. Pode ser um segredo
seu, algo muito particular. Mas que seja real, que seja a
concretização possível do sonho que será o norte da sua vida a
partir do momento em que começar a persegui-lo. Que seja pouco, que
seja o mínimo no começo, mas que seja real. E que você invista seu
tempo e sua energia naquilo, aumentando e melhorando com o tempo.
Isso fará toda a diferença nos seus resultados e dará outro gosto
à sua vida. Sonhar e perseguir os sonhos traz sentido para uma vida
aparentemente sem propósito. É assim que tenho lidado com minha
rotina e é isso que recomendo a todos que passam pelo que eu tenho
passado.
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