Não
temos controle sobre nossos pensamentos. As imagens e palavras se
formam na nossa cabeça sem qualquer possibilidade de obedecerem a
nossa vontade, só nos restando a opção de alimentar ou não o
pensamento que surge. Na maioria das vezes o que pensamos reflete
algo que vimos ou passamos no mundo real. É apenas uma consequência
de algum estímulo externo. Mas há casos em que uma ideia surge sem
explicação aparente, talvez do cruzamento entre outros pensamentos,
e se torna persistente. Se repete frequentemente como se estivesse
atraindo a atenção para si, “querendo” crescer, se enraizar. E,
em alguns casos, é preciso enfrentar a ideia como algo a ser
combatido dentro de si.
Um
exemplo disso ocorre comigo de tempos em tempos. Tenho uma ideia de
morte que volta e meia aparece entre meus pensamentos e preciso me
esforçar para desviar no fluxo de pensamentos. Não se trata de
tendência suicida, não penso em tirar minha própria vida. É mais
como uma certa impressão de conforto na ideia de morrer. Como se uma
parte de mim estivesse ansiosa por deixar esse mundo. Algo como não
querer puxar o gatilho, mas não achar ruim ser atingido por uma bala
perdida, sofrer um enfarte ou cair com o avião.
Sempre
que esses pensamentos surgem preciso me esforçar para desviar a
atenção e digo para mim mesmo “não pensa besteira”. É algo
com que eu tenho que lidar.
A
vida de vez em quando se mostra sem sentido, sem lógica. Uma
sequência de acontecimentos bons e infortúnios que invariavelmente
vai terminar um dia com a chegada da morte. Começo a me perguntar
por que tenho que passar por todo esse caminho, por que preciso
superar tantas dificuldades e sentir todo o medo, insegurança, toda
a frustração de uma vida inteira para chegar no final e terminar
como qualquer outro ser vivo, com o corpo se decompondo em outras
substâncias enquanto as lembranças do que eu fui e fiz somem nas
areias do tempo. Onde está o sentido disso? Por que preciso esperar
minha vez de passar pela morte? Já que é inevitável, por que não
passar por isso logo?
Esses
pensamentos são perigosos e habitam minha mente. Em algumas épocas
se tornam mais presentes do que em outras, mas nunca somem
definitivamente. Sobretudo por eu não encontrar nenhuma resposta
satisfatória para essas perguntas. Tenho receio que essas ideias
cresçam dentro de mim e acabem evoluindo para algum comportamento
autodestrutivo ou surjam com uma solução suicida para os problemas.
Preciso admitir que tenho medo que isso aconteça. Por isso enfrento
esses pensamentos fugindo deles, não os alimento nem lhes dou
atenção. Convivo com a vontade de morrer ignorando sua presença
dentro da minha mente.
Não
me lembro ao certo quando foi a primeira vez que algo assim me
ocorreu. Tenho lembranças de imaginar meu próprio velório já na
infância, no início da adolescência. Com o tempo a ideia de partir
desse mundo só se tornou mais clara, nunca me abandonou. É algo que
não costumo falar com ninguém, uma coisa realmente bem íntima que
certamente deixará preocupados todos que se importam comigo e
conhecem minha história. Mas, como disse, não tenho controle sobre
isso. O máximo que consigo fazer é usar minha consciência de forma
a bloquear e enfraquecer as ideias de morte. Acredito que isso seja o
certo a se fazer nesse caso.
Por
algum motivo esses pensamentos existem dentro de mim e não consigo
eliminá-los definitivamente. Preciso viver com a presença deles. E
decidi que não vou permitir que se tornem mais complexos do que
meros impulsos irracionais, não permitirei que se tornem ideias
fundamentadas e complexas na minha paisagem interior. Valorizo minha
vida e não quero abrir mão dela. Não quero deixar ninguém triste
pela minha ausência e nem perder as vivências e experiências que
ainda estão por vir. As vezes consigo descrever esse jeito de ver as
coisas, cortejando a morte, como uma certa preguiça de viver. Uma
preguiça tão grande, tão profunda, que é preferível morrer do
que ter que fazer tudo o que preciso fazer. Algo como uma solução
prática para um problema difícil, que é viver. Uma parte ruim de
mim, um instinto viciado de fugir de tudo que me tire da zona de
conforto. Uma coisa que preciso aperfeiçoar na minha personalidade.
Talvez o desejo de morrer seja o resultado de um defeito. Um sintoma
de falha.
Seja
como for, é algo que preciso enfrentar. Tenho que travar batalhas
internas para não deixar esse mal crescer dentro de mim. Mal esse
que para se proliferar só precisa que eu não faça nada. Que deixe
solto, que não aja. Ele se desenvolve do mesmo jeito que surge, do
nada. Do vazio. E é algo que preciso estar atento para não deixar
evoluir para algo maior. Para não se tornar uma ideia norteadora de
ações.
Andar
na linha passa por policiar a si mesmo. E essa é uma das brechas na
segurança na qual preciso estar sempre antenado, consciente, para
agir rapidamente e neutralizar os efeitos. Hoje tenho consciência
disso e trabalho para que não haja espaço em mim para esse tipo de
ideia, pensamento, impulso ou seja lá o que for, que me conduza a um
caminho errado. É uma das faces do adversário que habita minha alma
e o tempo todo me puxa para as trevas. Uma das ferramentas do
personagem feito de escuridão que preciso derrotar dia após dia
para seguir fazendo o certo.
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