A
liberdade está intimamente relacionada com a vontade. Quanto mais
liberdade se tem, mais vontades pode-se satisfazer. O contrário
também é verdadeiro, quanto menos liberdade menos vontades pode-se
realizar. A liberdade permite o fazer e o não fazer, o ter e o não
ter. Almejar mais liberdade é querer escolher mais, querer menos
liberdade é aceitar mais o que vem espontaneamente, abrir mão da
escolha. Mais liberdade é caminho do prazer, menos liberdade é o
caminho do sofrimento. Abrir mão da liberdade é não escolher mais
nada, levar a liberdade às últimas consequências é poder escolher
o que quiser, poder realizar qualquer desejo.
Cabe
deixar claro, liberdade é bem mais do que realizar desejos. É,
antes disso, o poder de escolher realizar ou não um desejo. O desejo
é a forma de interagir com a liberdade. O escolher não realizar um
desejo e não desejar é uma manifestação da liberdade. A liberdade
se manifesta em graus. O desejo também.
O
desejo se manifesta de duas formas: o desejo do ter e o desejo do
fazer. E estas formas norteiam as decisões humanas, dão o
direcionamento para a liberdade que se tem.
Em
pessoas no qual o ter predomina, é fácil observar um grande empenho
em obter bens materiais. Em pessoas no qual o fazer predomina, vemos
um maior empenho em desfrutar de sensações.
Há
influência do ter no fazer, as vezes o ter se mescla ao fazer, e
vice versa, em diferentes graus. Frequentemente é preciso ter para
poder fazer, da mesma forma, as vezes é preciso fazer para poder
ter. Mas sempre há uma intenção predominante, sempre há uma
motivação primária, e esta é sempre ter ou fazer algo.
O
ter é material, vincula objetos, títulos e condições às emoções.
Estabelece satisfação pela sensação de posse sobre o que quer que
seja. Por isso pessoas que são mais influenciadas pelo ter tem maior
necessidade de controle sobre as coisas. Precisam exercer a posse
sobre o que tem.
O
fazer é imaterial, vincula ações e movimentos às emoções.
Estabelece satisfação pela sensação de concluir tarefas ou atos
de qualquer natureza. As pessoas mais influenciadas pelo fazer tem
certa aversão ao controle e vivem suas vidas aceitando as coisas que
ocorrem conforme são, sem necessidade de controlar o que acontece.
Não há tanto prazer na posse mas, sim, na própria feitura da ação.
As lembranças do que foi feito são o pagamento que precisam para se
satisfazerem.
Deixar-se
a mercê do acaso intensifica as sensações, ao passo que programar
o que vai acontecer reduz expectativas e ilusões, portanto,
enfraquecendo as sensações do que acontece. A surpresa brilha com
muito mais força do que a previsão. Quem quer sentir mais quer
sentir tudo. Quem quer ter tudo não se importa de sentir menos para
tal. O fazer é lidar com o desconhecido, um dos mais assustadores
atos humanos. O ter é não ser surpreendido, estar preparado.
Para
fazer muito é preciso não planejar, o caos é o senhor do sentir.
Quanto mais uma pessoa é organizada, mais beneficia o ter, mais
coisas terá e menos fará. Quanto menos organização mais coisas
fará e menos terá. Organizar para fazer é como desorganizar para
ter, pode ocorrer mas contraria a regra e não exerce a função em
plenitude. Organizar é ter, improvisar é fazer. Quem almeja ter
mais do que tem precisa organizar mais sua vida, quem deseja sentir
mais deve se permitir enfrentar o acaso com mais frequência.
Não
desejar, se libertar do desejo, pode vir de duas formas: satisfazer
todas vontades e, portanto, por terem sido todos satisfeitos não ter
mais nenhum desejo, ou destruir todos os desejos aumentando a
tolerância ao sofrimento à níveis infinitos, tornando-se capaz de
aceitar qualquer coisa que aconteça, por pior que seja, sem desejar
que fosse diferente.
Ambos
são caminhos que levam ao mesmo fim, o não querer, o não desejo. O
que é a forma de desvincular a liberdade do desejo. Ambos os
caminhos exigem habilidade sobre-humana. Sem o desejo pode-se
experimentar o nível supremo da liberdade pura. A liberdade da
liberdade. É não interagir mais com a liberdade por estar em pé de
igualdade com ela. É ser mais do que humano, ser abstrato tal qual a
própria liberdade.
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